Ao longo de anos a pesca excessiva ameaçou a população de sardinhas em décadas anteriores, mas Portugal e a União Europeia têm conseguido implementar políticas de conservação eficientes para proteger e preservar as populações de sardinha, garantindo a sua sustentabilidade. Medidas como quotas de pesca, períodos de defeso e restrições na captura de peixes jovens têm permitido a recuperação das populações de sardinha nos últimos anos.
Durante os meses de verão em Portugal, a sardinha ganha um destaque especial na gastronomia. Nas tradicionais festas dos Santos Populares em junho, é comum encontrar sardinhas a serem grelhadas nas ruas, criando uma atmosfera festiva e calorosa. A sardinha grelhada, servida com pão, salada e pimentos assados, proporciona uma refeição deliciosa e tradicional.
Entrevistamos dois reconhecidos Chefs portugueses para entender melhor a importância da sardinha na nossa gastronomia e de que forma é incorporada nos seus restaurantes.
O Chef João Oliveira, do Restaurante Vista, destaca os desafios de trabalhar com a sardinha, considerando a sua sensibilidade desde a pesca até chegar ao consumidor. Realça a importância de respeitar todo o potencial deste peixe tão especial: "Os desafios para mim enquanto Chef são saber respeitar todo o seu potencial. É um peixe ultrassensível, a sua qualidade depende de muitos fatores: pesca, acondicionamento, tempo até chegar ao consumidor. Por exemplo, a sua frescura é o mais importante, assim como a sua qualidade em termos de quantidade de gordura, tamanho e textura."
O Chef Ljubomir Stanisic, do Restaurante 100 Maneiras, realça que a sardinha está presente nos seus restaurantes, sempre na sua época. Destaca a criatividade na incorporação da sardinha, utilizando diferentes técnicas e apresentações. Ljubomir menciona a importância de preservar a sua autenticidade, enfatizando que "a sardinha já tem tanto sabor que não é preciso muito para realçá-lo. Acho que é um produto extremamente rico e, por isso, há que ter cuidado em não estragar."
João Oliveira menciona que, na sua experiência, os melhores acompanhamentos são os pimentos assados, tomate Rosa ou Coração de Boi, orégãos frescos, cebola grelhada, tentando no seu restaurante fazer estas junções tradicionais, não se encontrasse o Vista em Portimão, a capital da sardinha em Portugal. Conforme refere "são dois os motivos pelos quais a sardinha se destaca efetivamente no nosso restaurante: pelo sabor inconfundível e características únicas e pela localização do Vista: de frente para o oceano Atlântico".
Ljubomir Stanisic faz referência ao histórico da sardinha na cultura portuguesa, mencionando que "Sabemos que a sardinha sustentou muitos soldados na II Guerra Mundial, tendo sido cozinhada em paté e em conserva, sendo um dos alimentos principais, a par do atum. Esse grande trabalho foi feito pelas antigas conserveiras portuguesas."
O Chef do Restaurante 100 Maneiras menciona a sua preferência por filetar a sardinha, curá-la em sal e açúcar, com gengibre, lemongrass e alho, e depois passá-la pela marinada 24 horas antes de servir, enfatizando que isso realça o sabor da sardinha. Também destaca a importância de pequenos detalhes que podem fazer a diferença na experiência gastronómica: "Pimentos assados, uma tapenade de azeitona com mel e tomilho, são, sem dúvida, pequenos detalhes que realçam a sardinha."
Em relação à sazonalidade da sardinha, João Oliveira enfatiza "quando não temos sardinha fresca fazemos algumas conservas, nomeadamente de ovas de sardinha, também fazemos um molho de sardinha fermentado, que iremos utilizar ao longo do ano para intensificar outros momentos do menu, como por exemplo, uma sopa de peixe". Ljubomir menciona que nos seus restaurantes também só utiliza a sardinha fresca com permissão de pesca e, caso necessário, utiliza a sardinha em conserva e o garum, feitos internamente. Conforme refere "uma das melhores partes é usar as espinhas e os restos de tripas da sardinha e preparar um garum que pode ser curado durante um, dois ou três anos. Ficamos com umas gotas de líquido que são um perfume autêntico, como já faziam os antigos romanos. Usamos o garum para temperar vários caldos e até mesmo outros peixes. A sua época deve ser respeitada, tal como todas as outras captações do mar".
Numa declaração de amor à sardinha Ljubomir refere ainda "A sardinha, para mim, é um produto tão versátil que dá para ser usado de todas as maneiras. Tanto gosto de fazer uma simples sopa, um creme de sardinha, como gosto de ver a sardinha sublime só passada pela brasa, pelo carvão, marinada, feita em nigiri, ceviche ou até mesmo como um tártaro. A sardinha, para mim, não tem limites. Desde que olhemos para ela como o peixe sensível e elegante que é, não tem fim. O futuro está nas nossas mãos. Só temos de ter o cuidado em não a estragar. A nossa única obrigação é cuidar bem dela.
Ao equilibrar a preservação da autenticidade e tradição da sardinha com a busca por novas abordagens culinárias, ambos os Chefs destacam a importância de cuidar bem da sardinha e respeitar a sua época de captura. João Oliveira e Ljubomir Stanisic reafirmam o seu compromisso em preservar a genuinidade da sardinha, ao mesmo tempo em que procuram inovações culinárias respeitando a tradição e a cultura gastronómica portuguesa.
Desta forma, a sardinha continua a ser um elemento essencial nos pratos de João Oliveira e Ljubomir Stanisic, seja na sua forma mais tradicional, grelhada com acompanhamentos clássicos, ou em criações inovadoras que destacam a sua frescura e sabor incomparáveis. Através da criatividade e evolução da cozinha, a autenticidade e tradição da sardinha são preservadas, permitindo que este tesouro gastronómico continue a ser apreciado por muitas gerações futuras.
Alguns restaurantes onde pode apreciar o sabor inconfundível da sardinha são: Taberna d'Adélia, na Nazaré; O Marinheiro, na Póvoa de Varzim; Camelo, em Santa Marta de Portuzelo; Tasquinha da Linda, Viana do Castelo. Entre muitos outros de Norte a Sul de Portugal.
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Foto do cabeçalho: Sardinhas e sal © GettyImages