Mais do que pratos saborosíssimos, o Bib Gourmand Fitó serve a seus clientes culinária afetiva com uma pitada de ativismo em São Paulo
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*crédito Rafael Jacinto
A família Bib Gourmand cresceu em 2018! Entre as boas novidades desta edição do guia MICHELIN está o Fitó, restaurante de culinária afetiva e inspiração nordestina no bairro de Pinheiros, em São Paulo. A casa traz clássicos piauienses como carne-de-sol, carneiro no leite de coco e paçoca, elaborados com esmero pela cozinheira Cafira Foz, a Fitó! E atenção #girlpower: O cardápio é totalmente feito e servido por uma equipe 100% feminina. O guia MICHELIN bateu um papo com Cafira, em uma entrevista que você pode conferir abaixo:
Você sempre quis ser cozinheira?
A gastronomia sempre me encantou. Passei minha infância no estado do Piauí, e lá via a criação de vários animais e de rituais culinários, como a Carne de Sol, mas nunca pensei em trabalhar profissionalmente na área. Decidi optar por empreender na gastronomia após viajar para vários países e perceber que só a gastronomia traz esse sentimento de pertencimento e de aconchego, mesmo em outro continente. Foi assim que decidi transformar minha paixão pela culinária em profissão.
Como surgiu o conceito do Fitó?
O Fitó é um restaurante de alma afetiva que traz uma culinária brasileira da região do Nordeste, especialmente do Estado onde cresci, Piauí. A proposta do Fitó é, em um ambiente aconchegante e despretensioso, ser uma extensão da minha casa.
Qual a sua principal inspiração culinária?
Minhas grandes inspirações na cozinha são minha mãe e avó. Nunca as vi preparando comidas pesadas – um forte preconceito que as pessoas têm da culinária nordestina. Pensando em quebrar esse padrão, me inspiro nelas ao fazer uma comida saudável, saborosa e simples.
Alguma memória afetiva na hora de cozinhar ou criar novos pratos?
Sempre lembro de uma experiência que considero reveladora, num restaurante asiático na França. Pedi um pato com lichia e arroz de jasmim e fiquei muito emocionada. Eram ingredientes da minha vida, como coentro, louro, caldos, pimentas, especiarias e sabores que remetiam à minha terra, à minha infância. Foi assim que vi que era com aquilo que gostaria de trabalhar, para trazer esse sentimento às pessoas.
Sobre a equipe feminina: por que escolher compor seu quadro apenas por mulheres?
Eu sempre adorei a presença da mulher e as poucas experiências que eu tive na cozinha foram bem traumatizantes. Ambientes machistas, opressores e poucas mulheres em cargos de direção. Aqui, buscamos dar oportunidade, vez e voz a minorias.
Você pode contar um pouco do dia a dia com a sua equipe?
Trabalhar em um ambiente feminino é muito benéfico na cozinha. Acredito que temos uma certa “mágica feminina” e que nós, mulheres, temos o poder de nos conectarmos com os alimentos e, assim, deixar a comida mais potente. Eu desconheço essa história de que não conseguimos trabalhar juntas.
Você acredita que sua culinária levanta uma bandeira pela inclusão?
O ambiente do Fitó é mesmo feminista, porque acreditamos num conceito de feminismo que é o da igualdade, igualdade de oportunidades, algo que ainda está em processo no Brasil. São recorrentes os casos, seja na gastronomia, seja na política, de machismo, misoginia e de homens decidindo o futuro das mulheres. Aqui buscamos dar oportunidade, vez e voz à minorias.
Que outras ações o restaurante realiza nesse campo?
Formamos uma equipe LGBT, temos uma hostess transexual, equipe de bar feminina e formada por lésbicas e o Mariano, um homem trans. A proposta é a de acolhimento e de respeito às escolhas de cada um. Não admitimos preconceitos, homofobia, misoginia entre a nossa equipe e muito menos entre nossos clientes.
Alguma dica para as mulheres que sonham em trabalhar com gastronomia?
A dica que dou é: precisamos lutar para não perder o que já tínhamos conquistado a duras penas e seguir ampliando a luta. Nós temos o dever de exigir e lutar por isso e também de dar o exemplo no que nos cabe. Quando trabalhei em alguns restaurantes em São Paulo, achei as cozinhas e o ambiente extremamente machistas, mulheres eram minoria nos postos-chave e encarei aquilo como um desafio para mim, algo que não gostaria de ver reproduzido no meu restaurante. Mas esse é o cenário que as mulheres vão encontrar nesse mercado, infelizmente.
“Trabalhar em um ambiente feminino é muito benéfico na cozinha. Acredito que temos uma certa “mágica feminina” e que nós, mulheres, temos o poder de nos conectarmos com os alimentos e, assim, deixar a comida mais potente.”
Cafira Rego, cozinheira do restaurante Fitó, junto da equipe do restaurante.
Crédito: Ludmilla Bernardi
Paçoca de carne de sol da casa com farinha de mandioca, manteiga de garrafa, servida com baião de dois, banana da terra e queijo coalho.
O que seria da cozinha sem a nostalgia, sem lembrança de uma figura familiar inclinada sobre uma panela fumegante? Philip Chronopoulos, chef do Restaurant du Palais Royal, em Paris, divide sua grande memória: o ovo com tomate de seu avô.
Um inspetor ítalo-americano do Guia MICHELIN reflete sobre a tradição do sul da Itália de transformar tomates que amadurecem ao sol em um molho sem igual chamado la salsa di pomodoro.