Quando Cafira Foz inaugurou o Fitó, Bib Gourmand de São Paulo que serve comida nordestina, levou para dentro da cozinha e do salão do restaurante um despojamento elegante, traduzido nas cores vivas e no astral da casa.
Cafira Foz, em frente ao Fitó. Foto: Divulgação
Como não gosta de usar nada na cabeça - acessórios a incomodam um pouco - seguiu usando grampos e presilhas para manter os cabelos bem presos. Pouco antes da inauguração, cortou-os bem curtinhos, justamente para cabelo não virar uma preocupação. “Eu aproveitava pra pintar o cabelo com mechas coloridas, para trazer a diversão que tanto gosto, e transgredir um pouco”, conta ela.
Visitar o Fitó é, de certa forma, conhecer um pouco da personalidade de sua dona, quase como encontrá-la ali ou visitar sua casa.
“Saí da cozinha de casa para a cozinha do Fitó. Nessa transição da cozinha caseira para uma cozinha profissional, não aderi ao dólmã, por exemplo. Segui usando roupas que eu achava que uniam conforto e beleza”, afirma ela.
O estilo de Cafira chama atenção. Ela, que cresceu no Piauí, veio morar em São Paulo para trabalhar com moda e fez uma conversão de rota depois de visitar a mãe na França e emocionar-se num restaurante vietnamita.
Na lida diária, Cafira usa roupas de algodão, camisetas de banda com calças confortáveis, aventais coloridos, vestidos amplos que sejam bons para movimentação na cozinha. “Me mantive igual no trabalho, até para me olhar no espelho depois de várias horas marchando intensamente na cozinha e me sentir bem comigo mesma, sem esquecer quem sou.”
A estética transborda para a equipe 100% feminina, que se veste de forma simples e elegante. O uniforme preto do Fitó é feito de algodão ou de moletom, e contrasta com lenços rosas, azuis e bege. A maior preocupação foi com a modelagem das calças, para que as meninas não se sentissem desconfortáveis nas funções.
“Óbvio que pensei em modelagens que fossem visualmente legais, para que elas sentissem orgulho de vestir, de vir direto de casa já uniformizadas e para que elas sentissem que são realmente parte daquele organismo, com roupas que respeitem os corpos. E, claro, para nos sentirmos lindas e representadas né?”, completa a chef.
Paixão de adolescente
O avental cobre o corpo de Lucas Dante, chef do Cepa, Bib Gourmand de São Paulo, mas não esconde pescoço, braços e mãos tatuados.
Lucas Dante e suas tatuagens, na cozinha do Cepa. Foto Arquivo pessoal
Dante já era um entusiasta das tatoos muito antes de decidir pela carreira gastronômica e de se tornar chef. A “rebeldia de adolescente”, em suas palavras, o fez gostar de ouvir reggae e punk. Aos 15 anos, fez a mãe chorar ao tatuar uma caveira no antebraço. “Já comecei rasgando o RG”, brinca ele, hoje aos 33.
Dante perdeu a conta de quantas tatuagens tem pelo corpo. “Hoje a sociedade aceita muito mais os tatuados. Por um lado, isso é bom. Mas a banalização da tatuagem ofende um pouquinho quem começou de forma mais autêntica, opina ele.
Chegar todo tatuado em uma cozinha profissional não lhe causou nenhum transtorno, garante. “Cozinha é meio que um outro mundo, mesmo. Nunca tive problema para arrumar emprego, nem para nada. Há 15 anos, tudo isso era visto de outra forma. Meus pais mesmos viam tatuagem de forma marginalizada.”
Sua última tatuagem foi feita há pouco menos de três anos, “fechando” o braço. Nenhuma delas tem a ver com gastronomia. “É questão de gosto, claro, mas prefiro desenhos mais aleatórios, motivos orientais.”
Presente simbólico
A jardineira jeans que virou marca registrada aconteceu por acaso na vida da chef Roberta Ciasca, que comanda o Miam Miam, Bib Gourmand do Rio, aberto há 16 anos.
Roberta Ciasca, no salão do Miam Miam. Foto Divulgação
“Naquela época nem havia tantas maneiras modernas de se vestir, na cozinha. Mas eu havia ganhado uma jardineira que achei a coisa mais confortável do mundo. A partir dela, mandei fazer outras, em diversos modelos, e decidi que esse seria meu uniforme de trabalho”, afirma a chef.
Roberta, que passou anos sem usar dólmã, confessa que “até curto usá-lo hoje em dia”. Por baixo, veste uma calça confortável. “Mas, quando estou no Miam Miam, não adianta. Tenho de botar meu avental-jardineira por cima de tudo”, diz.
Seu uniforme sempre foi calça, camiseta, tamancos e os aventais-jardineira. Para complementar, usa lenços nos cabelos que combinam com o vestuário. “O curioso é que você vai usando sempre, vira marca registrada e as pessoas começam a te dar mais bandanas de presente. Hoje, tenho uma coleção”, conta Roberta, rindo.
O adereço simboliza tanto em sua carreira que resolveu emoldurar um deles. O quadro fazia parte da decoração de outro restaurante que tinha, o Oui Oui, e hoje está na parede de sua casa.