Como a cidade mais visitada do país — são mais de 17 milhões de turistas por ano —, o Rio de Janeiro há muito se firmou como o principal cartão-postal do Brasil. Suas paisagens, praias e estilo de vida já inspiraram canções, filmes, campanhas e narrativas mundo afora, sempre que se fala da identidade brasileira.
A importância do Rio, no entanto, é também histórica. Fundada em 1565 como um posto estratégico para proteger a Baía de Guanabara dos franceses, a cidade cresceu rapidamente como porto exportador até se tornar capital da colônia portuguesa, em 1763. Décadas depois, em 1808, seu papel como centro político e cultural se consolidou com a chegada da família real portuguesa e da corte, em fuga das invasões napoleônicas.
Transformada em sede do Império Português, a cidade passou por modernizações urbanas, viveu uma efervescência cultural e estabeleceu uma conexão mais direta com a Europa, especialmente entre a elite intelectual. Terra do samba, do choro, da bossa nova e das novelas, o Rio se afirmou como símbolo do Brasil no imaginário mundial: de Copacabana às escolas de samba, do Cristo Redentor aos Arcos da Lapa.
Hoje, embora o poder econômico esteja, em grande parte, concentrado em São Paulo, a Cidade Maravilhosa mantém sua força como um dos centros criativos mais pulsantes do país. Agora, sua gastronomia também ganha projeção internacional, com chefs e restaurantes que apresentam a identidade carioca à mesa com uma cozinha que vai muito além dos estereótipos tropicais.
Em outubro, a capital fluminense será a cidade convidada da San Sebastián Gastronomika, um dos eventos mais relevantes do setor no mundo, que acontece entre os dias 06 e 08 de outubro, no País Basco. Representando o Rio estarão nomes como Felipe Bronze (Oro), Rafa Costa e Silva (Lasai) e Thomas Troisgros (Toto e Oseille) — os três como chefs convidados —, além de Elia Schramm (Babbo Osteria) e Danilo Parah (Rudä e Maskä), que integram a comitiva. Uma prova de que a cozinha carioca não conhece fronteiras.
A seguir, os restaurantes que estão ajudando a definir uma nova cara da gastronomia brasileira e, de quebra, a colocar o Rio de Janeiro no mapa da culinária global.

Lasai: o minimalismo do bom produto
Em um balcão intimista de dez lugares deste discreto e elegante restaurante em Botafogo, o chef Rafa Costa e Silva transforma vegetais colhidos em suas hortas do Itanhangá e do Vale das Videiras em um menu-surpresa que muda conforme a estação e a disponibilidade do que chega à sua cozinha. A ideia é simples e sofisticada: mostrar o Brasil por meio de seus ingredientes, vindos de produtores fluminenses — de pescadores a agricultores — que ajudam a compor suas receitas minimalistas. Cada prato é preparado diante dos clientes, em uma cozinha que se move com precisão e leveza para ressaltar sempre o melhor que cada produto tem a oferecer.
Território Aprazível: o Brasil à mesa
Entre as ladeiras do boêmio bairro de Santa Teresa, o restaurante comandado pela chef Ana Castilho celebra a cozinha brasileira com sotaque carioca. Os ingredientes orgânicos e biodinâmicos chegam de diferentes cantos do país, com foco nos produtos locais e nos pequenos produtores. Aqui, nenhuma carne é congelada: tudo é servido com o máximo frescor. O cardápio propõe um passeio pelo Brasil com pratos como o acarajé do cerrado — reinterpretado como um pastel de angu —, a galinhada caipira, feita com linguiça mineira, couve e feijão “surpresa”, ou ainda o ceviche com tucupi e chips de banana-da-terra. A carta de vinhos naturais e os drinques autorais completam a experiência, sempre acompanhada pela vista exuberante da cidade.
Sud, o Pássaro Verde: culinária de afeto brasileira
Na casa da chef Roberta Sudbrack, no Jardim Botânico, a proposta é simples e direta: cozinhar histórias com produtos de quem planta e cria nas proximidades. O cardápio muda todos os dias, guiado pelo que chega fresco dos produtores locais, enquanto o forno a lenha junto ao salão principal e a charmosa cozinha aberta compõem o cenário ideal para os pratos servidos. Entre receitas simples e emocionantes, o bolo de chocolate molhadinho é quase um ritual de despedida — um clássico que nunca sai de cena.
Rudä e Maskä: do afetivo ao cosmopolita
À frente das duas casas está o chef Danilo Parah, que mostra seu talento ao transitar entre propostas diferentes sem nunca perder o foco na valorização dos produtos brasileiros. No Rudä, ele desenvolve uma cozinha afetiva, onde técnica e memória se encontram. A casa funciona como um espaço de celebração da diversidade de ingredientes do Brasil, com um cardápio em constante renovação e em diálogo direto com a sazonalidade. Tudo aqui parece pensado para criar um ambiente de acolhimento, em que cada prato conta uma história do território.Por outro lado, no Maskä, o chef olha para o Brasil com um viés mais cosmopolita, combinando ingredientes frescos de origem local a técnicas contemporâneas. É um restaurante que propõe uma cozinha autoral ousada, sem abrir mão da precisão e da sofisticação, mas com um pé firme nas referências brasileiras que marcam a trajetória do chef.

Toto e Oseille: do casual ao requintado, com diversão
Em uma mesma casa elegante em Ipanema, o chef Thomas Troisgros criou dois conceitos distintos, distribuídos em andares diferentes. No térreo, no Toto, ele apresenta pratos que refletem suas memórias gastronômicas, combinando técnicas francesas e influências asiáticas, mas sempre com ingredientes sazonais brasileiros de qualidade. A proposta aqui é descomplicada, com foco na comida de conforto a preços mais acessíveis, em um espaço com decoração industrial e uma atmosfera descontraída que remete aos botecos cariocas.Já no segundo andar, o Oseille aposta em uma experiência mais sofisticada: um ambiente minimalista, com um balcão em formato de "U" para 16 comensais ao redor da equipe em ação, como se estivessem convidados para comer na cozinha da casa do chef. O menu degustação mescla brasilidade — em ingredientes de excelência — com a herança francesa que o chef carrega no sobrenome famoso. Apesar dos pratos técnicos e refinados, o clima é casual: os clientes podem até escolher que disco querem ouvir, em um espaço que Troisgros chama de fun dining — onde o mais importante é se divertir.

Oro: moderna gastronomia brasileira
Em uma esquina do Leblon, o chef Felipe Bronze mergulha fundo na cozinha brasileira para reinterpretá-la em versões criativas e técnicas — muitas vezes até lúdicas — no moderno e elegante restaurante Oro. O fogo é o centro da experiência, mas são os ingredientes — que vão de ostras frescas com granizado de goiaba a petiscos que transitam entre o Japão e o interior do Brasil — que contam a história à mesa. A parceria com a sommelier Cecilia Aldaz garante harmonizações à altura e reforça a ideia de que, ali, cada detalhe tem um propósito.Leia mais:
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Foto de capa: Os ingredientes do restaurante Lasai, liderado pelo chef Rafa Costa e Silva. © Rafa Costa e Silva
