Perfis 2 minutos 08 Dezembro 2020

ALIMENTANDO A EQUIPE

Uma incursão na refeição dos funcionários de grandes restaurantes

Os restaurantes são, normalmente, construídos em torno de uma comunidade. Em termos óbvios, são espaços onde os clientes se reúnem para uma experiência gastronômica paga. Mas eles também podem e devem ser entendidos como o núcleo de uma rede que agrega produtores, distribuidores e especialistas. Um espaço em que cozinheiros, chefs, garçons e gerentes se reúnem para fazer seu melhor trabalho.

As metáforas são muitas, mas nenhuma é usada com tanta frequência como a de que um restaurante é como uma família. Por isso, quando um estabelecimento fecha suas portas pelos efeitos de uma pandemia, o impacto é devastador e de longo alcance.

Nessa temporada difícil, o Guia MICHELIN fez uma pausa para chamar a atenção para a força e resiliência de seus restaurantes. Ao longo dos últimos meses, o Guia realizou eventos virtuais com líderes do setor para a celebração de algo pelo qual vale a pena lutar: a comunidade.

Os eventos foram inspirados não nos pratos servidos aos clientes no salão principal, mas na alimentação dos funcionários nos bastidores. Desde que os restaurantes existem, eles tratam de alimentar sua brigada, mais foi só em 1999, quando o Chef norte-americano Thomas Keller dedicou uma seção inteira de seu livro "The French Laundry” às receitas que usava nas refeições da equipe, que o conceito se tornou parte do vocabulário gastronômico. Um ano depois, o chef David Waltuck, do icônico restaurante nova-iorquino Chanterelle, publicou um dos primeiros livros dedicados exclusivamente ao assunto.

Aos poucos, a refeição dos funcionários – antes, algo tratado apenas nos bastidores – foi se tornando um dos assuntos preferidos dos escritores de gastronomia, levando a uma proliferação de livros com receitas sobre o tema. O mais famoso deles talvez seja The Family Meal: Home Cooking with Ferran Adrià, escrito pelo chef do espanhol el Bulli, três estrelas no MICHELIN.

Alguns podem definir esse ritual pela utilidade: trata-se, afinal, de uma refeição fornecida pela administração para manter a equipe cheia de energia para as horas de trabalho que tem pela frente. Outros podem invocar imagens românticas: repartir o pão significa fortalecer os laços entre os membros do time.

Independentemente de sua história e simbolismo, as refeições do staff varia de restaurante para restaurante. Desde a utilização artesanal do excedente até a colocação de pedidos especiais de ingredientes; desde dar aos cozinheiros uma chance de aprimorar suas habilidades até permitir que lavadores de pratos ou garçons mostrem um prato especial de sua cidade - não existe uma maneira única de fazer isso.

No n / naka, restaurante duas estrelas MICHELIN em Los Angeles, a Chef Niki Nakayama e sua equipe aproveitam ao máximo os excedentes do bentô que está sendo oferecido para viagem durante a pandemia. Partes de peixe e arroz entram para formar deliciosas refeições do pós-expediente. “É ótimo ter todo mundo ao redor, comer uma boa comida e poder relaxar depois do serviço”, diz Nakayama. Comer com os mesmos alimentos de altíssima qualidade que são servidos à seleta clientela é uma recompensa bem-vinda por um dia de trabalho duro, e ali a equipe tem um momento para se reagrupar e recuperar energias.

A chef Rocio Camacho, do Cozinha Mexicana do Rocio, um mexicano Bib Gourmand em Los Angeles se sente responsável não apenas por alimentar sua equipe, mas também por cuidar de cada um. Quando a pandemia chegou, ela embalou cestas com estoque de excedentes para seus funcionários levarem para casa. “Valorizamos nossa equipe tanto quanto nossa família e temos o privilégio de trabalhar junto com a maioria deles por muitos anos”, contou. A equipe do Rocio compartilha refeições até durante as férias e festas de Natal, comendo juntos tamales (massa normalmente feita à base de milho), pozole (sopa típica mexicana) e outras especialidades.

No Providence, do Chef Michael Cimarusti, duas estrelas MICHELIN em Los Angeles, a refeição em equipe é restauradora e também um espaço para exploração. “As refeições em equipe sempre foram uma parte importante do nosso dia”, disse ele. “Ter tempo para compartilhar uma refeição permite que todos nós respiremos fundo, relaxemos por alguns minutos e nos preparemos para a noite que está por vir", diz Cimarusti, que costuma investir em tacos de porco marinados (uma refeição recorrente de sábado completa com molhos frescos, guacamole, milho e tortilhas de farinha) ou larb, um prato tailandês.

É claro que em cada um desses casos, e em inúmeros outros, a alimentação da equipe é uma extensão dos valores de um restaurante. No melhor dos casos, os restaurantes oferecem uma pausa da rotina diária, uma oportunidade de se conectar e a promessa de boa comida para todos os envolvidos. Uma verdadeira refeição em família.

Escrito por Mahira Rivers, editora digital do MICHELIN Guide Digital North America.

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