Comendo fora 1 minuto 25 Março 2019

Sobremesa é coisa séria

Chefs confeiteiros invadem cozinhas de restaurantes renomados e alçam sobremesas
ao nível da alta confeitaria

Se você é da turma dos que não dispensam uma sobremesa há de reconhecer o quão frustrante é terminar um jantar incrível - com direito a ótimos pratos salgados - com uma singela fatia de abacaxi. É aí que entra a chamada alta confeitaria, que promete finalizar sua experiência com primor.

Foi-se o tempo em que as sobremesas, mesmo em restaurantes renomados, eram feitas pelo cozinheiro que estivesse menos atarefado naquele dia - ainda bem. De uns anos para cá, cada vez mais casas têm recrutado chefs confeiteiros para pensar, criar e preparar com maestria as etapas doces do cardápio.

“A última etapa da refeição deve fechar a experiência com chave de ouro. Uma sobremesa ruim pode arruinar tudo”, frisa Rodrigo Ribeiro, chef confeiteiro do Bib Gourmand Petí Gastronomia. O contrário também vale: “pode reparar, quando tudo dá errado em um jantar, quase sempre se resolve com uma sobremesa cortesia”, brinca.


Preta, sobremesa monocromática de Rodrigo Ribeiro, do Petí Gastronomia (Foto: Divulgação) 

Em suas criações, Rodrigo não faz diferenciação de ingredientes doces e salgados. “Tudo pode ser usado em uma receita doce, dependendo da quantidade e da combinação”, acredita. Tudo mesmo, inclusive shoyu, que nas mãos do chef saiu do seu lugar comum - de molho salgado oriental - para virar “pérola” de shoyu, saquê e yuzu, na sobremesa monocromática Preta, que também leva ganache de gergelim negro, molho de cacau e gengibre, crumble de cacau alcalino e tuile de gergelim.

Brenda Freitas, chef confeiteira do estrelado Maní, também gosta de explorar ingredientes, à primeira vista, inusitados em uma sobremesa. Berinjela, pepino, flores, carvão (isso mesmo, carvão). Certa vez, preparou um merengue de azeitonas para balancear a doçura da compota de toranja (grape fruit), também servida com coalhada e sorvete de gim. Outro exemplo é a flor de lírio-do-brejo com coco, cambuci e sorbet de morango (foto topo/Roberto Seba).

“Acho importante abrir os olhos das pessoas para a confeitaria, que não está restrita ao chocolate e às frutas vermelhas. Há um universo imenso de possibilidades e a Helena [Rizzo, chef do Maní] me dá bastante liberdade para criar”, afirma Brenda.


Mochi com gelato de pêssego, do Tuju (Foto: Julia Rodrigues)

Além de criativo, o chef confeiteiro precisa ter conhecimento de causa e apuro técnico para preparar sobremesas que se prezem em um restaurante de alta gastronomia. “Antes da criação vem o conhecimento. É preciso estudar muito, ir a fundo e ser perfeccionista nos preparos. Senão você sempre vai fazer algo meia boca”, afirma Rhaiza Zanetti, chef confeiteira do estrelado Tuju.

Consciência que aprendeu na prática. Há dois anos, quando foi incorporada à equipe do restaurante, Rhaiza não esperava ficar muito tempo entre as sobremesas. “Existe um preconceito enraizado na cozinha de que a confeitaria é uma ala menor, algo cujos processos podem ser absorvidos pela garde manger [cozinha fria], no improviso. Eu também pensava assim.” Hoje, arrebatada pelo preciosismo e pelos desafios da praça, não quer mais saber dos pratos salgados.

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