Fique por dentro 2 minutos 30 Agosto 2019

As fritas de Blumenthal

Resultado da técnica de cozimento triplo, elas ficam crocantes por fora e supermacias por dentro; para o próprio chef, receita da batata frita perfeita é um de seus maiores legados

Quando o assunto é batata, as fritas do chef Heston Blumenthal são tão célebres na gastronomia quanto o purê de Joel Robuchon. Hoje em dia, essas tais batatas fritas perfeitas - fofinhas por dentro e supercrocantes por fora - são encontradas nos menus de restaurantes e gastropubs em toda a Grã Bretanha, mas, na verdade, a receita foi desenvolvida na cozinha da casa de Blumenthal, em 1992, três anos antes do chef inaugurar o The Fat Duck, hoje com três estrelas MICHELIN.

“Nada mal ser conhecido por reinventar a batata frita”, retruca Blumenthal quando perguntado sobre como se sente por ter entrado para a história por conta de suas fritas perfeitas. “Foi o primeiro prato que eu criei, tem um lugar especial no meu coração.”

O lado científico da gastronomia

Por trás dos óculos de armação grossa, os olhos de Heston Blumenthal brilham com bom humor e inteligência enquanto ele fala sobre sua carreira culinária. Nos anos que se seguiram após sua incursão no universo das batatas, o chef se autointitulou “pioneiro em cozinha multissensorial e defensor de uma compreensão científica para culinária”.


Chef Heston Blumenthal, dono da fórmula da batata frita perfeita (Foto: The Hind's Head, Alisa Connan)

No auge da gastronomia molecular, Bumenthal era um de seus garotos propaganda. “Não estamos falando do fim da década de 1990 e início dos anos 2000, quando a gastronomia molecular caiu na graça da imprensa e se reduziu a pipetas, esferificação, espumas e ingredientes químicos. Há uma completa incompreensão do termo”, afirma. “Ovo cozido é gastronomia molecular. Chefs de cozinha são físicos na prática - nós estragamos coisas, misturamos substâncias, cozinhamos, transformamos moléculas. Fazemos física para alimentar.”

Foi com essa abordagem científica que Blumenthal mergulhou na busca da batata frita perfeita em 1992. Para alcançar o resultado desejado, com crosta estaladiça, centro macio e fofo, com palitos que não ficam “encharcados” após esfriar, o chef estudou todos os fatores que poderiam influenciar no processo de cozimento, do teor de amido das diferentes variedades de batata à temperatura do óleo utilizado. Ao fim da ampla pesquisa e de todos os testes realizados, Bumenthal chegou ao que se chama hoje de “triple-cooked chips”, ou seja batatas triplamente cozidas.

A técnica dos três passos

O método mais conhecido de fritar batatas é o de dupla imersão. A primeira, com óleo em temperatura mais baixa, é para cozinhar as tiras de batatas. Já a segunda imersão, realizada logo em seguida e com óleo em temperatura mais alta, serve para formar uma crostinha crocante. No entanto, isso faz com que as batatas comecem a ficar encharcadas antes mesmo de chegarem à mesa, já que a umidade do interior macio se transforma em vapor e amolece a crosta.

Assim, Blumenthal empenhou-se em desenvolver uma batata frita que mantivesse a sua crocância. A receita pede batatas cortadas simetricamente - o chef prefere os tipos mais densos e cheios de amido, como a Asterix -, cozidas em água fervente de 20 a 30 minutos, até que as tiras estejam quase se desmanchando. Em seguida, elas são drenadas, colocadas em um rack de resfriamento para secar e, então, são deixadas congelador por uma hora ou até que a umidade seja totalmente removida.

Frite, então, as batatas em pequenas porções, imersas em óleo a 130º C, até que uma crosta amarela clara (e não marrom) se forme. As batatas devem ser drenadas novamente e levadas ao freezer por mais uma hora para, então, serem fritas pela segunda vez, em óleo a 180º C, por aproximadamente sete minutos ou até atingirem uma crosta marrom-dourado.

Pensando friamente, a trajetória gastronômica de Blumenthal ostenta uma boa lista de pratos autorais, pelos quais o chef foi ficando cada vez mais conhecido ao longo dos anos. É o caso do Meat Fruit, um parfait de fígado de frango em forma de tangerina, e do Sound of the Sea, cujos comensais escutam o som das ondas do mar e das gaivotas enquanto degustam sashimi. “Há muitos pratos que eu gostaria de pendurar na parede do The Fat Duck. Quero traçar uma linha do tempo, que mostre a evolução da minha cozinha - não apenas o prato em si, mas toda a pesquisa e tudo o que foi feito para ele vingar”, diz. “E pode ter certeza, as batatas fritas, cozidas triplamente, terão um local de destaque nessa parede.”

Fique por dentro

Continue a explorar - Histórias que pensamos que irá gostar de ler