Dos fumeiros e das caças ao cabrito assado no forno, dos azeites aos vinhos conhecidos em todo o mundo, a Região Porto e Norte, que será o palco da Gala do Guia MICHELIN no próximo 25 de fevereiro de 2025, é um destino imperdível pela sua rica tradição enogastronómica. Mas também pelas suas paisagens deslumbrantes, que percorrem aldeias escondidas entre montanhas e preservam uma profunda relação com a terra deste canto inóspito e generoso do país, com uma essência tão genuinamente portuguesa.
Tradições seculares — como a dos Caretos, os personagens mascarados que participam de uma singular celebração pagã — mantêm-se ao longo do tempo neste território, onde cursos de água serpenteiam pelos vales, alimentando vinhedos, olivais e castanheiros que se adaptaram ao frio rigoroso do inverno e ao calor seco do verão.
É para tirar o melhor proveito desta paisagem tão única e pitoresca que a seguinte rota para se fazer de mota foi concebida. Neste trajeto por Trás-os-Montes, homologado pela Real Federación Motociclista Española, podemos percorrer estradas romanas e cruzar pontes históricas, admirar o rio Douro a correr entre as montanhas de socalcos e fotografar as amendoeiras em flor que tomam a paisagem por quilómetros no final do inverno. Por isso, a melhor altura para se aventurar por estas estradas é em fevereiro e março, quando os dias frios são acompanhados dos raios de sol que começam a dar a cara com mais intensidade.
Mas, independentemente do mês, a rota também serve como pretexto para saborear a gastronomia local em restaurantes que celebram as ricas culinárias transmontana e duriense — que, por si sós, já seriam motivo suficiente para visitar a região. História, natureza e boa comida se unem neste percurso sobre duas rodas.
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Bragança: antes de mais, boa comida
A nossa jornada de 300 km pelo Norte de Portugal começa em Bragança, uma cidade aninhada na beleza acidentada do nordeste de Portugal e repleta de uma história tão intrigante como as suas antigas muralhas de pedra. O ponto de partida é a Pousada de Bragança - São Bartolomeu, mantida há gerações pela família Geadas. É nela que fica o G Pousada, restaurante reconhecido com uma Estrela MICHELIN que ganhou notoriedade pela cozinha que mescla a tradição transmontana, refletida tanto no receituário quanto na escolha de produtos locais, com técnicas apuradas.Os irmãos Geadas — com Óscar na cozinha e António no serviço e na seleção vínica — transformaram o restaurante num verdadeiro destino gastronómico, provando que a diversidade da culinária portuguesa vai muito além do eixo Lisboa-Porto. À sombra do Castelo de Bragança, o menu do G Pousada muda consoante as estações, mas presta sempre homenagem aos ingredientes locais, como o cuscuz de Vinhais, o porco Bísaro, os cogumelos, as castanhas e o queijo Terrincho — que aqui serve de recheio para um dos clássicos do chef: a Bola de Berlim salgada.

Primeiros quilómetros: de Bragança a Gimonde
Bem alimentados depois de um pequeno-almoço reforçado na Pousada de São Bartolomeu, é hora de pegar a estrada. A N218 atravessa vales verdejantes e campos rústicos até Gimonde, uma pequena aldeia conhecida pelas suas pontes centenárias, pela tradição do fumeiro artesanal e por ser a terra de Elisabete Ferreira, eleita a Melhor Padeira do Mundo pela União Internacional de Panificação e Pastelaria (UIBC).Esta primeira paragem é também uma pausa estratégica para admirar o rio Maçãs, onde a tranquilidade da água cria quase um espelho natural que reflete o céu — o lugar perfeito para algumas fotos antes de seguir viagem.

O Douro: entre fortalezas e miradouros
A rota leva-nos ao Castelo de Algoso, uma construção medieval imponente, erguida sobre um rochedo e envolta em lendas. Pela N221, continuamos até ao miradouro do Colado, de onde o olhar se perde na vastidão do Parque Natural do Douro Internacional, cuja vegetação tomada por bosques serve de habitat para diversas aves endémicas.À medida que descemos em direção ao Douro Superior, o terreno começa a transformar-se. O granito cede espaço ao xisto, criando solos que absorvem e refletem o calor, um fator essencial para a maturação das vinhas. O Vale do Douro, profundo e serpenteante, marca a fronteira entre Portugal e Espanha e oferece vistas de tirar o fôlego, com as suas águas a cortar os vales de forma majestosa. Aqui, as montanhas começam a abrir-se em socalcos, e a viticultura molda a paisagem de forma quase escultórica, com pequenos caminhos que ligam as quintas históricas que se debruçam sobre o rio.

De Poiares a Pocinhos: vestígios romanos e estradas panorâmicas
De volta à estrada, seguimos pela N221 até a estrada panorâmica de Poiares, região que preserva vestígios do Neolítico, da presença romana e muçulmana, além de antigas rotas de peregrinação, com alcatrão em perfeito estado e curvas bem desenhadas. Em pouco tempo, surge um testemunho da história: a Calçada Romana dos Alpajares, uma antiga via de pedra percorrida por exércitos e mercadores durante séculos. A sensação é de viajar através do tempo.Dali, atravessamos Pocinho, passando por uma das estradas mais cénicas de Portugal, onde o Douro se estreita entre costas vertiginosas e ondulantes. No verão, o calor é intenso, enquanto no outono, as vinhas tingem-se de vermelho e laranja, num espetáculo visual que reforça o caráter épico da região.
A estrada acompanha o rio, permitindo conduzir ao lado das vinhas e dos socalcos que produzem alguns dos melhores vinhos portugueses. Mais adiante, os Lagos do Sabor surgem como um refúgio inesperado de tranquilidade. Nascidos com a construção da Barragem do Baixo Sabor, correspondem a 70 km de águas cristalinas até à foz do Azibo, interligados por gargantas e penhascos, que formam um verdadeiro santuário da vida selvagem.

Podence e a tradição dos Caretos
A rota não estaria completa sem uma paragem em Podence, a aldeia que mantém viva uma das tradições mais vibrantes do Norte de Portugal. Ali, no fim do inverno e início da primavera, durante o Carnaval, os Caretos — personagens mascarados de trajes coloridos e chocalhos — protagonizam o ritual pagão do Entrudo Chocalheiro, reconhecido como Património Imaterial da Humanidade pela UNESCO.Aqui, a cultura e a identidade transmontana revelam-se na sua essência mais autêntica e representam uma nova forma de olhar para as tradições de uma região marcada pelo despovoamento.

De volta à Bragança — e à boa mesa
Com a rota a chegar ao fim, é hora de regressar a Bragança pela N15, onde a boa comida é sempre um motivo para voltar. A cidade preserva uma gastronomia autêntica e robusta, que comprova por que a cozinha transmontana é uma das mais genuínas do país.Aos pés do Castelo de Bragança, a Tasca do Zé Tuga presta homenagem à culinária local com pratos como o Caldo de castanhas e nabo e o Bacalhau demolhado com puré de tremoços. O chef Luís Portugal combina criatividade e tradição num menu de degustação que revela novos sabores sem perder a identidade regional.
Outra opção para desfrutar dos sabores transmontanos é o restaurante O Javali, de Alberto e Maria do Carmo, que se destaca há duas décadas pelo uso dos melhores produtos locais. O javali, que dá nome à casa, pode ser servido estufado com castanhas ou acompanhado de laranja e maçã, enquanto pratos clássicos como o Cordeiro bragançano e butelo (um enchido típico) chegam à mesa com batatas e legumes da região.
Entre estradas panorâmicas, fortalezas, rios e aldeias cheias de história, a rota termina como deve ser: com a celebração da cultura e da gastronomia, após percorrer a paisagem única do Norte de Portugal e vivenciar a calorosa hospitalidade dos transmontanos.
Imagem de capa: Paisagem do Vale do Douro © ruivalesousa/iStock
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