Fique por dentro 2 minutos 30 Setembro 2019

É suco, só que não

Drinques não-alcoólicos tornam-se populares nos Estados Unidos, à medida que cada vez mais restaurantes incluem sucos e chás - incrementados com conservas, especiarias e xaropes - na carta de bebidas

Para clientes que não querem consumir bebidas alcoólicas durante um jantar, eis uma alternativa aos vinhos. Um número crescente de restaurantes tem oferecido coquetéis não alcoólicos, feitos a partir de sucos de frutas e de vegetais, para harmonizar com os pratos do menu-degustação. O estrelado Noma, em Copenhague, é conhecido por ter iniciado esse movimento uma década atrás, seguido pelo três estrelas MICHELIN Maaemo, em Oslo, e pelo novaiorquino Atera, duas estrelas MICHELIN.

Também entre os vanguardistas, o restaurante Dialogue, que tem duas estrelas MICHELIN, em Santa Monica, na Califórnia, conta com uma mixologista especialmente dedicada aos drinques não alcoólicos. Hansuk Cho, inclusive, já havia trabalhado em posição semelhante no também estrelado Single Thread, situado em Healdsburg, mais ao norte do estado americano. Cho estima que pelo 30% dos clientes do restaurante têm optado por esse tipo de harmonização, por uma série de motivos, desde mudanças no estilo de vida a querer evitar uma ressaca. “Há quem esteja grávida ou em tratamento médico, alguns são menores de idade ou evitam consumir álcool por motivos religiosos, e há quem simplesmente escolhe não beber naquela noite”, diz.

Cho criou cinco drinques diferentes para harmonizar com o curso de 20 etapas do menu-degustação. O jantar começa com uma versão de “Cherry Coke” feita na casa - a partir de água com gás infusionada com suco de cereja, flor de laranjeira, lavanda e outras especiarias - que cai muito bem com os quatro primeiros pratos do menu: um com raiz de aipo e cerejas, outro com funcho, o terceiro, composto por ostra, cogumelos e folhas de dente-de-leão, e o quarto, estrelado por uma combinação de brócolis e cogumelos. “É desafiador harmonizar uma única bebida com todos esses sabores tão diferentes, mas isso torna o meu trabalho bem divertido”, afirma Cho.

Para a etapa doce, ela serve um suco clarificado de maçã com pera, folhas de pêssego e cardamomo, cuja proposta é evocar o sabor de um Sauternes (vinho branco francês de sobremesa). “As folhas conferem notas de amêndoas e nozes”, diz Cho. “Esse drinque também é levemente picante”, acrescenta.

Quando cria drinques não-alcoólicos para harmonização, Cho procura sempre minimizar o teor de açúcar e maximizar os aromas, para que as receitas sejam agradáveis no nariz e não pesem no estômago. “Eu sempre coloco ao menos um componente floral, além de um tempero de cozinha nas receitas”, revela. “Eles acrescentam notas aromáticas bem interessantes.”

O cargo de Cho é, de fato, coisa rara em restaurantes, mas ainda que outras casas não possam se dar ao luxo de ter um mixologista exclusivo para os drinques sem álcool, como o Dialogue, não significa que elas estejam tratando o assunto com menor atenção.

No Minibar, duas estrelas MICHELIN, em Washington, D.C., o chef Jorge Hernandez acompanha de perto a criação dos chamados Virtue, nove drinques não-alcoólicos feitos na casa para acompanhar os aproximadamente 28 pratos da degustação. O restaurante trabalha com essa opção de harmonização 0% álcool já há alguns anos, mas só agora ela vem ganhando popularidade - atualmente, cinco a cada dez clientes (de um total de 26 por noite) optam pelos pelos drinques sem álcool.

Além dos sucos de frutas frescas, outros componentes com perfis de sabor mais complexos - como chás, picles, conservas, fermentados, assim como especiarias e xaropes - são frequentemente incorporados às receitas de drinques não-alcoólicos. “Se fosse só suco, não passaria de uma água com açúcar saborizada”, afirma Hernandez. “A lógica é a mesma dos coquetéis com álcool: construir a base e depois brincar de combinar doses disso e daquilo em proporção, até que a bebida harmonize com o prato.”

Criar um drinque para harmonização é como um “jogo coletivo”, diz Hernandez. Os chefs fazem a maior parte do trabalho de pesquisa, levando em conta as opiniões do sommelier e da equipe de serviço. Por fim, começa o trabalho do bartender, que cria a receita final.

As bebidas chegam à mesa juntamente com os pratos, começando pelas versões mais claras e brilhantes, caminhando para os drinques fermentados e mais complexos. No momento, o drinque de abertura, feito com suco de aipo, água de maçã, chá de camomila, pimenta branca e limão, é servido com um porção de pequenos snacks. As etapas seguintes são harmonizadas com um coquetel fermentado, feito com pedaços de abacaxi. Para acompanhar a sobremesa, os comensais degustam um mix de chá fermentado de pu’er com alga koji, bergamota em conserva e caramelo de leite de cabra, servido com bastante gelo.

No Minibar, os drinques não alcoólicos são servidos em garrafas de vinhos decoradas com rótulos customizados, para lembrar os consumidores sobre a complexidade dessas bebidas - algumas, inclusive, são finalizadas à mesa. Destaque para o drinque, em cartaz nessa temporada, que combina suco de vagem de ervilha, Seedlip Garden (bebida destilada não alcoólica), espuma de leite de amêndoas e fava tonka ralada. “No fim das contas, não estamos servindo um suco”, avalia Hernandez. “Servimos drinques que equivalem aos vinhos para harmonizar com os pratos.”

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